Este arquivo é uma tentativa de usar o esquecimento para sermos recordados. Contém 12 rostos oraculares que já não nos pertencem e que lançamos ao espaço, ao tempo e à intempérie para permitir uma circulação de lógica aleatória.
Este não é um arquivo para aceder ao passado nem para aventurar um futuro; é um arquivo que se está a fazer através do encontro e do desencontro.
Este é um arquivo em fuga.
Notas da Curadoria 
sobre o Arquivo
Desde a primeira edição de Linha de Fuga que se propõe a um artista participante do laboratório tentar responder à pergunta “como se arquiva o efémero?” e acrescenta-se a esta pergunta uma outra reflexão: e o que se deve arquivar de um encontro entre artistas que vêm com processos e investigações artísticas encontrar outros artistas, desenvolver os seus trabalhos e deixar-se emergir num ambiente de total experimentação mas também onde se produz muito conhecimento?
A edição de Linha de Fuga 2024 propunha a reflexão sobre o tema “Enfrentar Medos”. Em cada edição se forma um coletivo efémero durante três semanas à volta de uma questão social que permita pensar a força da coletividade. O laboratório Linha de Fuga é um espaço de residência, de encontro, de formação, de produção de conhecimento e também um espaço de exploração de sensibilidades e de formas de viver coletivamente. Durante este período existem momentos de trabalho coletivos, momentos de trabalho individuais, diálogos e contaminações que permitem avançar ou mesmo duvidar sobre os processos e criar uma rede de conexões que sustentem as fragilidades individuais. Na edição de 2024, estiveram em Coimbra 12 artistas de distintos países, assumindo a cidade e o contexto como um ambiente de experimentação.
Claudia Ganquin foi a artista arquivista selecionada. Trazia a proposta de observar mas também de provocar os seus companheiros a desenvolver práticas de pensamento sobre a sua forma de criar um arquivo. Claudia também apresentou o seu processo de arquivo: performou instalações a partir da sua observação e do seu olhar sobre o trabalho e práticas dos outros, com um olhar afetuoso sobre os medos de cada um, pôs rostos a chorar e ofereceu pedras a todes. E partiu com memórias, conversas e muitas imagens gravadas. Durante um ano refletiu sobre o que deveria ser este arquivo e insistiu sobre a necessidade da sua tridimensionalidade que se expõe no Ponto de Encontro do festival na edição de 2025, uma instalação que é a sua visão de um corpo-arquivo onde as memórias estão enterradas, como descobertas arqueológicas de um passado que é também o presente.Um ano para construir um arquivo não é muito tempo para refletir e devolver ao mundo o que aconteceu. Mas Claudia tem um aliado na nossa organização. Linha de Fuga assume que um arquivo representa uma visão subjetiva da realidade, uma premissa importante para o desenvolver com a liberdade total e como uma criação. Em todas as edições as propostas são diferentes, de acordo com a visão autoral de cada pessoa.  Se existe um ato científico de catalogação de informação, assumimos, enquanto estrutura artística, que a missão dos arquivos de Linha de Fuga não é a de ser imparcial, tal como não é a História nem nenhum arquivo, mas é antes uma visão sobre a sensibilidade de atos tão frágeis como o de criar uma obra artística. Se esta sai das entranhas e urgências de cada artista, como podemos querer que um arquivo não se atravesse também por essa sensibilidade?
Claudia refletiu sobre o seu arquivo com várias perguntas que lhe ressoaram durante e depois do laboratório: os medos e as fragilidades de cada artista participante, a memória das suas práticas mas, acima de tudo, queria entender que corpo poderia ter esse arquivo. E que memórias se apegam ao nosso corpo?
Claudia assume assim também essa subjetividade e apresenta um arquivo com todas as suas memórias pessoais. Este arquivo, como ela própria diz, não faz parte do passado, mas é antes uma reflexão sobre pensamentos e práticas de artistas que, durante um tempo, tiveram a liberdade de poder viver e partilhar os seus medos e expôr as várias feridas da sociedade e da humanidade através da arte. Mas é também uma reflexão sobre o que significa arquivar algo tão sensível como essas mesmas reflexões. Num ato de generosidade profunda, este arquivo também demonstra a sensibilidade da humanidade para enfrentar os seus próprios medos, até o medo de cristalizar num arquivo momentos que são pura memória.
Catarina Saraiva
curadora Linha de Fuga
Criação
Claudia Ganquin
Colaboração Artística
Joaquin Segade e Juan Gasparini
Olhar Crítico
Catarina Saraiva
Agradecimentos
Lao Lamannamúsica no video de Bárbara Cordeiro:  Ruth Etting Love Me Or Leave Me (1929)filme no video de Bárbara Cordeiro:  “Las armonias de Werckmeister” direção: Bela Tarr (Hungria, 2000)
Todas as demais músicas e sonoridades utilizadas nos vídeos fazem parte das obras e do ambiente gravado ao vivo.
Web Design 
Joana Daniela Oliveira
Várias das fotografias utilizadas nos vídeos pertencem a Paulo Abrantes.